Na terça-feira (27), o Ministério da Saúde (MS) lançou a campanha que celebra os 30 anos do Dia Mundial de Luta contra a Aids, comemorado em 1º de dezembro. De acordo com a UNAIDS, programa das Nações Unidas que atua no combate à Aids, desde o início da epidemia da doença, por volta de 1980, 35,4 milhões de pessoas no mundo morreram por causas relacionadas à doença. De lá para cá, relatórios da UNAIDS mostram que os esforços intensificados em testagem e tratamento do HIV estão alcançando mais pessoas que vivem com o vírus e que as mortes relacionadas à Aids caíram mais de 51% em 2004. Esses relatórios podem ser acessados e .
No Brasil, segundo o MS, o país também chega aos 30 anos de luta contra o HIV e Aids com queda no número de casos e óbitos. A garantia do tratamento para todos, lançada em 2013, e a melhoria do diagnóstico contribuíram para a queda, além da ampliação do acesso à testagem e redução do tempo entre o diagnóstico e o início do tratamento. No total, 21 estados apresentam redução na taxa de mortalidade, entre eles, Minas Gerais. Os antirretrovirais, medicamentos usados no tratamento da doença, são totalmente financiados pelo governo federal. O Sistema Único de Saúde (SUS) oferta um dos melhores medicamentos do mundo para tratamento da doença, o dolutegravir.
Em Contagem, segundo a Diretoria de Vigilância Epidemiológica (Divepi) da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), no ano de 2017, foram notificados 144 pacientes infectados pelo HIV e 60 casos diagnosticados de AIDS em residentes do município. Já em 2018, até a presente data, dados preliminares (sujeitos a alterações) dão conta de que foram cem pacientes infectados pelo HIV e 36 casos diagnosticados de AIDS em residentes de Contagem. Já de acordo com o Programa IST/AIDS e Hepatites Virais de Contagem, atualmente, 1.511 adultos estão em tratamento no Serviço de Atendimento Especializado.
Para saber mais sobre o panorama atual da doença e contribuir para a disseminação de informações em relação à prevenção e tratamento em Contagem, confira a entrevista com o médico infectologista Leandro Curi, do SAE do Programa IST/AIDS e Hepatites Virais do município, localizado no Centro de Consultas Especializadas (CCE) Iria Diniz.
Aids e HIV são a mesma coisa?
Não. HIV é simplesmente o vírus que contamina. Se a doença se desenvolve, o que nem sempre chega a acontecer, a gente chama de Aids.
Quais são as principais formas de contágio?
Transmite-se HIV com sexo desprotegido vaginal, anal ou oral. A mãe, quando tem HIV, também poder transmitir na amamentação para a criança, e também quando ela tem HIV, no canal do parto, se ela não estiver com um bom tratamento. O HIV também é transmitido com objetos perfurocortantes contaminados, como agulhas.
E alicate de unha?
Alicate de unha e tesourinha não são uma forma de transmissão muito eficiente para HIV, mas sim para outras doenças, como Hepatites B e C. Mas no beijo, no abraço, no compartilhando talheres e copos não se transmite HIV, e nem dormir junto, sentar no mesmo assento ou compartilhar assento sanitário.
Quais são os sintomas que podem indicar que a pessoa está com o vírus da Aids? E haveria um período em que esses sintomas se manifestariam?
Como há várias formas de a pessoa apresentar o quadro de ficar doente ou não, tem gente que não tem sintoma nenhum. E isso é um perigo, porque ela transmite o HIV sem saber que tem. Em alguns casos, a pessoa pode ter problemas respiratórios, na cabeça, neurológico, ínguas, que são os linfonodos aumentados, mas que podem se passar por outras doenças virais. Então, esses sintomas não querem dizer necessariamente que se trata do HIV ou que vai dar em alguma doença. Por isso, a melhor forma de saber se existe contaminação por HIV é fazendo o diagnóstico, o teste. Se você teve atividades de risco, como sexo desprotegido por exemplos nos últimos seis meses, faça o teste, para não ter surpresas futuramente.
Então, a recomendação quanto à periodicidade de realização de teste de Aids é a testagem de seis em seis meses?
Pessoas que tiveram vários parceiros não testados devem fazer, sim, o teste de seis em seis meses, para o controle.
Qual a diferença entre o teste rápido e o convencional? Tem vantagens ou desvantagens em relação ao grau de confiabilidade do resultado?
Existem diferenças, assim como existem vários tipos de teste. Mas o teste rápido, que é uma picadinha no dedo, com resultado em 15 minutos, é bem recomendado e pode dar um resultado bem fiel. É claro que, diante de um resultado positivo, você precisa fazer outros exames confirmatórios. Mas o teste rápido é uma ótima fonte inicial de diagnóstico.
Em relação à chamada "janela imunológica", em que a pessoa já estaria contaminada com os vírus, mas os testes ainda não seriam capazes de detectar: isso existe mesmo?
Hoje em dia, com os testes mais modernos, em pouco tempo, umas três a quatro semanas, pode-se fazer o teste e se a pessoa estiver contaminada, já aparecerá no exame. E às vezes até aparece antes, mas no momento em que tenha ocorrido a contaminação, em cerca de um mês já dá para saber. É importante dizer que se a pessoa achou que se contaminou ela tem até 72 horas desde quando teria ocorrido a contaminação para se prevenir, tomando a PEP.
O que é PEP?
PEP é a sigla para "Profilaxia Pós-Exposição ao HIV", um medicamento profilático tomado depois da exposição. Se a pessoa teve acidentes perfurocortantes no hospital, ou em casa, ou na rua, ou teve sexo desprotegido, ela deve buscar atendimento na Unidade de Pronto Atendimento (UPA), em Contagem, em todas as UPAs. E em caso de exposição sexual feminina, a mulher deve procurar o Centro Materno Infantil (CMI). E aí a pessoa vai tomar um medicamento por 28 dias, depois de fazer exames, para prevenir que, se o vírus entrou no corpo dela, ele não se manifeste. Com isso, a gente tem grandes chances de conseguir eliminar esse vírus, para a pessoa não desenvolver a infecção.
Qual a diferença entre PEP e PrEP?
São duas siglas que significam coisas diferentes. A PEP significa "Profilaxia Pós-Exposição", sobre a qual acabamos de mencionar. Já a A PrEP é a "Profilaxia Pré-Exposição", voltada às pessoas que estão em situações vulneráveis e que podem usar a medicação diariamente, para prevenir a infecção. Por exemplo, as pessoas que não têm parceiro fixo, profissionais do sexo, pessoas transexuais ou que têm relacionamento com alguém que já têm o HIV e homens que fazem sexo com vários homens. São pessoas que tem maior risco de contrair o HIV e que podem usar o medicamento profilático que, com o uso da camisinha, vai dar uma excelente proteção para evitar a infecção. Isso já é uma realidade no Brasil e no mundo.
Mas a PrEP tem sempre uma indicação médica clara, correto? Critérios muito claros, porque não é qualquer pessoas que pode tomar a PrEP.
Exato. Tem que existir indicação para tal. Tem uma triagem, um encaminhamento e tem que fazer um tratamento com infectologista, assim como quem já trata o HIV.
Quais são os tratamentos utilizados atualmente? São remédios combinados, cada pessoa pode utilizar um tipo diferente de medicamento?
O tratamento consiste em vir às consultas, fazer exames corretamente, seguir claramente as orientações do médico que atende àquele paciente, usar a medicamente corretamente, como prescrito, e aí é levar basicamente uma vida normal, sempre tentando o caminho da via salutar, da vida saudável, praticando atividade física, usando proteção no sexo, para não se contaminar com outras infecções sexualmente transmissíveis, e fazendo o controle adequado. Quando esse controle está estabilizado, o retorno é de seis em seis meses, muito fácil de fazer. É muito mais fácil tratar o HIV depois de diagnosticado do que muitas outras doenças, como por exemplo o diabetes.
Mesmo que as pessoas estejam contaminadas e levem uma vida praticamente normal, se seguirem o tratamento corretamente, existem efeitos colaterais com o uso dessas medicações?
As medicações hoje, disponibilizadas no Brasil, pelo SUS, são muito boas, muito modernas. Com isso, a gente lida mais facilmente com qualquer tipo de queixa que o paciente tenha. As medicações anteriores eram muito mais agressivas para o organismo e traziam mais efeitos colaterais. Hoje em dia, a maioria dos sintomas colaterais a gente consegue segurar bem com o tratamento adequado, no consultório mesmo e com um bom tratamento clínico. Então, hoje em dia, praticamente, há pouco efeito colateral. A maioria dos meus pacientes não relata nenhum efeito colateral. Essa é a realidade de 2018. Um bom tratamento, com pouquíssimo efeito colateral e muito eficaz.
O tratamento é oferecido somente pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil?
A disponibilidade de medicamento vem através do governo federal. O tratamento pode ser feito com médicos da via pública ou particular, lembrando que na via pública do SUS ele é universal, ou seja, para todas as pessoas que desejarem. E a medicação é basicamente pública.
Após a descoberta do vírus, hoje em dia, após todas as melhorias em termos de tratamento, qual é a expectativa média de vida de uma pessoa com HIV que segue corretamente os tratamentos? Ou não se diz mais sobre expectativa de vida?
Essa é uma boa pergunta. Obviamente, quanto mais cedo for feito o diagnóstico, quem faz tratamento adequadamente, os estudos atuais mostram, deste ano, que a qualidade e a expectativa de vida de quem tem HIV, tratando-se corretamente, aproxima-se muito da de que não tem HIV. Então, hoje em dia, vive-se bem e convive-se muito bem com o HIV. Reforço também que quem faz tratamento adequado e correto fica com a carga viral tão baixa que a pessoa chega a nem transmitir o HIV. Então, além de o bom tratamento garantir uma qualidade e expectativa de vida a longuíssimo prazo, as pessoas ficam velhinhas com saúde, com HIV, e sem transmitirem a doença. Mas, para isso, precisa-se do diagnóstico e do tratamento correto.
Hoje em dia, ainda faz sentido falar sobre "grupo de risco”, como quando a doença foi descoberta, há cerca de três décadas, e era comum associar a Aids aos homossexuais e aos hemofílicos?
Hoje em dia, não. Esse termo já está em desuso e é inclusive pejorativo. O que existe é comportamento de risco. Ou seja: qualquer pessoa está passível de se contaminar com HIV, independentemente de orientação sexual, condição sanguínea e idade: basta um descuido, uma relação desprotegida única para se contaminar.
Em Contagem, para onde as pessoas devem se dirigir para fazer testes e buscar tratamento?
Aqui em Contagem, o fluxo funciona da seguinte maneira, como na maioria dos locais no Brasil: o diagnóstico pode ser feito no Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA), aqui em Contagem localizado no localizado CCE Iria Diniz, nas várias Unidades Básicas de Saúde (UBS) espalhadas pela cidade ou em consultórios particulares. Com o resultado positivo, as pessoas são encaminhadas para o Serviço de Atendimento Especializado (SAE) para tratamento. No SAE, elas terão um acolhimento muito organizado, vão passar pela assistente social, que dará informações vitais sobre o tratamento e o programa, e serão encaminhadas ao médico, que dará prosseguimento ao tratamento. O CTA/SAE possui três infectologista para adulto e um infectologista pediátrico. E anexo ao SAE, há uma farmácia, onde se retira a medicação.
Por fim: qual a principal mensagem para as pessoas em relação à Aids?
Uma orientação que eu faço para todos os que eu conheço é "vamos acabar com a discriminação, vamos acabar com o preconceito, com o julgamento com os pacientes com HIV”. Porque hoje em dia, com um bom tratamento, é vida normal que segue. Com um bom tratamento, a doença vira uma condição crônica de saúde e o ciclo de transmissão é interrompido. Não tem porque ter estigma contra uma doença que nem chega a deixar a pessoa doente se houver um bom tratamento. Então, protejam-se, façam o teste e, em caso positivo, tratem-se. O pior vírus é o do preconceito.
TestagemNo dia 30/11, sexta-feira, das 8h às 16h, o Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) da rede SUS / Contagem, instalado no Centro de Consultas Especializadas (CCE) Iria Diniz, promoverá um mutirão para a realização de testes rápidos de Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST) / HIV. Clique para saber mais.