Você é contagense, transita pela cidade ou, ainda, passa pela Via Expressa e nunca reparou numa coluna de 12 metros de altura, ao lado esquerdo, no sentido centro? Saiba que não é o (a) único (a). Localizada na Via Expressa, próxima ao número 2.565, no Novo Eldorado, a Coluna Bracher foi projetada pelo arquiteto Gustavo Pena e construída em dezembro dos anos 2000, em homenagem à Comunidade dos Arturos. Ou seja, em dezembro comemorou 21 anos da obra.
“O convite para a execução foi feito ao pintor Carlos Bracher que optou por trabalhar em parceria com Fani Bracher, sua esposa e artista de reconhecido talento e experiência. Os artistas pesquisaram aspectos da cultura de Contagem e escolheram como referência a Comunidade dos Arturos e a Casa dos Cacos de Louça que, no entendimento deles, seriam os destaques da cultura local”, explicou Fernando Perdigão, assessor de artes visuais da Secretaria de Cultura.
Os Arturos constituem um importante agrupamento familiar, que busca manter e preservar em seu cotidiano as tradições, usos e costumes afro-brasileiros herdados de Artur Camilo Silvério, fundador da comunidade. “O culto à Nossa Senhora do Rosário permeia a atividade congadeira do grupo que articula um ‘reinado próprio’ reverenciado em seus principais festejos e atividades”, contou Perdigão.
Já a Casa dos Cacos é um importante monumento da cultura popular edificado em Contagem, fruto do sonho, talento e obstinação de Carlos Luís de Almeida, que revestiu toda sua singela casa com cacos de louça. Atualmente ela está sendo restaurada, com reinauguração prevista para o final do primeiro semestre de 2022. “A empreitada ocupou os últimos 20 anos de vida do senhor Carlos, que transformou o lugar num espaço vivo, lúdico e agradável, firmando-se como atração turística da região. Ao longo da história, a casa recebeu ilustres visitantes como Juscelino Kubistchek, Chacrinha e outras personalidades, além de milhares de visitantes que vinham de toda parte atraídas por sua originalidade e a reconhecida excentricidade de seu criador, um excelente anfitrião que fazia questão de receber as pessoas envergando uma inusitada indumentária, também revestida de cacos”, complementou o assessor.
Participar da Coluna Bracher fascinou os artistas Carlos e Fani Bracher. Fani chegou a caracterizar a Comunidade dos Arturos como o maior bem que o município possuía, atraído pela força de sua tradição e beleza de seus costumes. Alguns anos mais tarde chegou a realizar uma série de estandartes, embasados na cultura dos Arturos, tendo feito, inclusive, uma exposição na própria comunidade.
Carlos Bracher entusiasmou-se com a Casa dos Cacos, obra de seu conterrâneo de Juiz de Fora, que compara a Van Gogh quando se refere poeticamente à casa como “A Noite Ilustrada de Contagem”.
“Sempre tive curiosidade por manifestações da cultura africana no Brasil. Gosto muito das formas, das cores, elementos, criando uma harmonia incrível. Aprendi muito com os Arturos. Quando foi feito esse convite, casou perfeitamente com aquilo que já era desenvolvido por mim. Sou do interior e sempre tive contato com o congado, que sempre considerei muito mágico”, destacou Fani Bracher. “Junto ao Carlos (Bracher), fizemos um painel em Ouro Preto, imaginando sempre como ficaria, de forma dimensional. Lembro com muita alegria tanto da construção do painel, como na inauguração”, completou.
Para Carlos Bracher, além dos Arturos, que ele classifica como importante pela história, a Casa de Cacos também é de ser destacado: “Os Arturos muito nos encanta pela singularidade e por tudo em que está envolvido. Ficamos muito felizes em fazer esse projeto a quatro mãos, que muito nos orgulha, principalmente pelo retorno que tivemos. Uma homenagem a uma rica história de Contagem, que conta com uma comunidade tão bela e única, e com uma arquitetura diferenciada, que é a Casa de Cacos”.
Criação do projeto
Na criação do projeto, os artistas optaram pela técnica do mosaico, por sua reconhecida durabilidade e beleza, que seria disposto em uma coluna composta por quatro faces de 2m de largura por 12m de altura.
O mosaico foi composto por 2.400 azulejos de cerâmica branca pintados com pigmentos/esmaltes especiais para queima e fundição, dispostos em quatro painéis de concreto, contendo 600 azulejos cada.
Os artistas optaram por dividir o trabalho em duas partes iguais, cabendo à Fani duas faces e ao Carlos, duas. “Fani abordou a estética africana, estampada de maneira mais abstrata e estilizada, com referência ao vestuário, estamparia e iconografia do continente africano. Na face 1, uma negra ou negro de turbante e sarongue, com estampas de peles de animais.
Na face 2, uma coleção de símbolos gráficos, algo como uma coleção estilizada de grafismos que remetem ao sol e à lua, estrelas, noite e dia, terra, a relação da cultura africana com valores naturais”, explicou Perdigão. “Ao Carlos, coube a referência mais direta e figurativa aos Arturos, em desenhos que atestam toda sua sensibilidade e poder de síntese.
Nas duas faces está registrada sua destreza e habilidade para a figuração. Na face 3, estão esboços de personalidades da Comunidade, como Artur Camilo Silvério e seus descendentes representados como reis, rainhas ou capitães das guardas de congado”, continuou. “A face 4 exibe a representação de símbolos sagrados e adereços presentes nos festejos dos Arturos, como tambores, bandeirinhas, o rosário, estandartes de santos e a coroa. Na configuração final, percebe-se uma perfeita integração dos dois artistas, que se articularam na composição e execução da pintura, com intervenções mútuas em toda a área que constitui as quatro faces do monumento”, concluiu.
O artista Carlos Bracher é reconhecido como um dos artistas brasileiros vivos mais importantes. Desenvolveu ao longo de sua carreira um estilo próprio e bastante pessoal que se caracteriza pela densidade e materialidade da pintura, cores fortes, estilização dos motivos ou temas, velocidade e gestualidade na ação de pintar e desenhar, grande poder de síntese. Sua obra mais conhecida é a pintura da paisagem de Ouro Preto, cidade onde reside, mas desdobra-se em vários temas como retratos, naturezas mortas, outras paisagens e referências.
Já Fani Bracher é uma artista de projeção nacional, cuja produção, eclética, tem como características lirismo, estilização, simbolização, predileção por temas populares, densidade cromática. Impõe-se como uma artista cujo vocabulário estético é próprio, tendo merecido diversas referências críticas, premiações e publicações.