O município de Contagem tem sua história marcada pela forte presença da indústria. Seu desenvolvimento, ao longo das décadas, proporcionou um expressivo crescimento econômico e populacional. Consequentemente, o município precisou expandir seu território e, com isso, novas regiões foram surgindo na cidade, como a de Vargem das Flores. Originada na década de 70, ela transborda história, cultura e desenvolvimento, somando nos últimos anos, grandes obras de infraestrutura e urbanização. A região que começou tímida, hoje é composta por 27 bairros e abriga mais de 70 mil habitantes.
O nome da região simboliza uma de suas características mais marcantes: as vastas áreas verdes, nascentes e cursos d’água. Além de ser a região de maior extensão territorial, ocupando um terço da cidade, é também uma das áreas que concentra maior preservação ambiental. Tanto que, quando se fala na região, uma das primeiras imagens que vem à mente das pessoas é a represa Várzea das Flores. Mas o que muitos não sabem é que alguns bairros já existiam antes da construção da represa.
Um pouco de história
Vargem das Flores era uma área predominantemente rural, composta principalmente por fazendas e pequenas propriedades agrícolas e agropecuárias em sua maior parte. Um dos primeiros bairros foi o Retiro que, na época, serviu de abrigo para agricultores e trabalhadores das fazendas. Anos depois surgiu o bairro Nova Contagem, abrigando moradores migrados de outras regiões e a penitenciária Nelson Hungria, a primeira penitenciária de segurança máxima do Estado. Na sequência, as antigas fazendas Bela Vista e Solar do Madeira deram origem aos bairros Solar do Madeira, Estâncias Imperiais, Granja Ouro Branco e Quintas da Jacuba.
Construção do bairro Nova Contagem, na década de 70, e a visão geral do bairro hoje - Fotos: acervo Secult/PMC (1) e Victor Venâncio/PMC (2)
Nascido e criado no bairro Retiro, Décio Costa, 77, relatou que, no início, a região era deserta e com poucas famílias. Ele lembrou das aventuras da época e falou sobre a transformação da região e das melhorias.
“Minha família foi uma das primeiras daqui. A estrada era toda de terra e não tinha ônibus.
Quando eu era jovem, trabalhava de caminhão e dava carona para um tanto de gente.
Na época tinha só umas oito ou dez famílias. Não tinha nada de infraestrutura.
Foi uma mudança muito boa. Hoje é praticamente uma cidade. Tem tudo aqui.
Estamos muito satisfeitos!”.
Décio Costa, morador da região.
Foto: Victor Venâncio/PMC
Apesar do desenvolvimento urbano, a região continua com suas raízes, mantendo vivas as cavalgadas, exposições e comunidades tradicionais.
Trabalho coletivo
O senhor Décio contou ainda que, no início, para o crescimento e evolução da região, foi necessário muita ajuda e trabalho coletivo. Como exemplo, ele citou a capela de São Domingos de Gusmão, no Retiro, erguida pela comunidade local na década de 60. Outro patrimônio da população é a Capela Santo Antônio do Morro Redondo, construída na década de 1980, é um dos pontos mais altos da região, proporcionando uma das mais belas vistas da represa Várzea das Flores.
As capelas São domingos de Gusmão (ontem e hoje), no Retiro, e de Santo Antônio do Morro Redondo são exemplos do trabalho coletivo da comunidade pela construção de novos espaços na região - Fotos: arquivo Secult/PMC (1 e 2) e Victor Venâncio (3)
O bairro Tupã, um dos mais tradicionais da região de Vargem das Flores, que abriga uma enorme área de preservação ambiental, surgiu a partir do loteamento da antiga Fazenda do Chiqueiro. Os primeiros moradores eram pessoas de baixa renda, vindas da zona rural ou de outras áreas urbanas próximas, que buscavam moradia próxima à natureza. Apesar da ocupação ser antiga, só em 2024 foi desenvolvido um projeto urbanístico formal, possibilitando a implementação de melhorias.
Gilmar Batista Pereira, 64, morador do Tupã desde 1991, é um exemplo de quem se mudou para o bairro atrás de um lugar sossegado e perto da natureza para viver. Ele afirmou que viu de perto a construção da Escola Municipal Hilda Nunes dos Santos, a pavimentação da via que liga o bairro à LMG-808 e o transporte coletivo que foi chegando aos poucos.
Integrante da comissão de moradores do Tupã, Gilmar destacou que após, anos de reivindicação, com o apoio da Prefeitura, o bairro vem recebendo importantes intervenções desde o ano passado, como obras de drenagem, pavimentação e adequações nos passeios. “Todas essas intervenções têm melhorado a qualidade de vida dos moradores, trazendo mais conforto e segurança”, afirmou.
O morador do bairro Capim Rasteiro, Ricardo Filho, 40, disse que seu avô foi um dos primeiros a chegar ao bairro, em 1978. O advogado compartilhou os avanços que o bairro e seus arredores receberam. "Tivemos ganhos como as manutenções das estradas de terra, retorno do escolar e agora, recente, o Plano de Turismo, a Superintendência e a Conferência rurais. Nossa mobilização sempre foi por uma área rural cada vez mais forte, produtiva e turística".
Em relação à região como um todo, ele explicou que houve uma movimentação intensa e satisfação dos moradores, principalmente em relação ao asfalto, às reformas e construção de unidades de saúde, praças, Farmácia e Restaurante Popular. "Desde quando chegamos percebemos uma mudança enorme da região Vargem das Flores, com o surgimento de novos bairros, rodovias, comércio e serviços", frisou.
Contínuo desenvolvimento
A partir dos anos 2000, várias melhorias aconteceram na região, como a pavimentação em inúmeras ruas e avenidas, qualificação no saneamento básico e no transporte público, instalações de escolas infantis e ampliação no atendimento à saúde.
Grandes investimentos foram realizados e deram origem à Cozinha Comunitária e ao Restaurante Popular de Nova Contagem. Ao longo dos anos, a região foi expandindo e, hoje conta com 22 unidades escolares, atendendo do ensino fundamental ao médio de forma gratuita e com qualidade. Na área da saúde, o território conta com a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Vargem das Flores, Unidades Básicas de Saúde (UBS) e farmácia distrital, totalizando 17 pontos de serviços.
Em 2026, a população terá um grande ganho na mobilidade com a conclusão do terminal Vargem das Flores e a implantação do Sistema de Integração de Mobilização (SIM). O terminal vai possibilitar a conexão da região com o restante da cidade e com as cidades da região metropolitana, de forma mais eficiente e confortável. Com investimento de aproximadamente R$ 43 milhões, o terminal é a última estrutura do SIM a ser concluída, com entrega programada para o segundo semestre do próximo ano, quando o sistema tem previsão de iniciar.
Berço das águas
Construída na década de 60 e inaugurada em 1972, a represa Várzea das Flores surgiu a partir da necessidade de criar um manancial para o abastecimento de água de Contagem e Betim. Um convênio foi firmado entre as prefeituras das duas cidades para a construção de uma barragem para conter os ribeirões Betim, Lage e Batata, dando forma à lagoa, que possui 87% da sua área em Contagem e 13% em Betim. Seus ribeirões formam um espelho d’água de 121,3km² e com 54km de orla. O reservatório é controlado pela Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) e integra o Sistema Paraopeba, que abrange o conjunto de reservatórios Rio Manso, Serra Azul e Vargem das Flores.
A represa Várzea das Flores foi construída (foto 1) para atender a demanda de abastecimento de água à época, hoje é uma importante área de preservação ambiental da cidade - Fotos: acervo Secult/PMC (1) e Victor Venâncio/PMC (2)
O manancial está localizado em uma Área de Proteção Ambiental (APA), instituída pela lei nº 16.197, de 26 de junho de 2006, abrangendo também a área da bacia hidrográfica (nascentes e cursos d’água) localizada antes do reservatório (lagoa). A APA possui importância fundamental para a preservação da qualidade da água, a manutenção do equilíbrio ecológico do rio Paraopeba, além da sua importância para o abastecimento de água de boa parte de Contagem, Betim e demais cidades da região metropolitana.
A área é composta por matas verdes preservadas, que abrigam nascentes que formam a lagoa e são importantes refúgios de animais e plantas, como a ave Quero-Quero e a flor Lírio do Beijo. Espécies típicas do Cerrado e Mata Atlântica também podem ser encontradas. Com o tempo, o local também se tornou um importante ponto de lazer, recreação e prática de esportes aquáticos para os moradores de Contagem e cidades vizinhas.
Proteção Ambiental
A região também teve ganhos com a aprovação e sanção, em 2023, do novo Plano Diretor da cidade. A nova lei recriou a Macrozona Rural, que havia sido extinta em 2018, aumentando em 3% a área demarcada, além de definir um novo tipo de zoneamento, a Zona de Proteção Ambiental (ZPA), que tem por objetivo garantir a preservação ambiental nas oito regiões.
Em Vargem das Flores, a ZPA abrange a Bacia de Várzea das Flores, definindo limites para a expansão urbana. A ideia é controlar o aumento descontrolado de construções e fortalecer as áreas que demandam proteção ambiental, reduzindo os efeitos das mudanças climáticas, em especial das enchentes e calor excessivo, ao promover o aumento da biodiversidade.
Lazer e entretenimento
Além da represa, na região Vargem das Flores também há outros locais de lazer. A Feira Livre de Nova Contagem, por exemplo, atrai milhares de pessoas que passam pelo local aos sábados e domingos. Fundada há mais de 36 anos, a feira localizada na avenida Ápio Cardoso, atualmente possui 150 expositores que comercializam diversos produtos, entre artesanato, vestuário, alimentos, entre outros.
Pertinho da feira está a praça do Coreto, um espaço dedicado ao lazer e aos bons encontros. O local também é palco de eventos e atividades para a comunidade, como o Festival Circo de Brinquedo, com apresentações e oficinas, e a realização de festas populares como o Arraiá de Contagem.
Outra opção para se divertir é o Centro de Artes e Esportes Unificados (CEU das Artes), que une cultura, esporte e assistência social de maneira integrada. Localizada na rua VP-2, 2490, em Nova Contagem, a unidade inclui uma quadra poliesportiva, uma pista de skate e uma de caminhada, brinquedos, um cineteatro, uma biblioteca, espaços de convivência, salas para oficinas e o Centro de Referência de Assistência Social (Cras). O CEU das Artes oferece atividades gratuitas diversas, incluindo cursos de música, dança, artes plásticas, esportes e de qualificação profissional.
E para o público que se encontra na melhor idade tem o tradicional Espaço Bem Viver (EBV) Luiz Palhares. Quem participa do serviço ofertado pela Prefeitura pode usufruir de muitas atividades e ações que promovem o envelhecimento digno, ativo e saudável. Lá, os idosos contam com bailão, aula de ginástica, artesanato, ioga e muito mais.
O local foi inaugurado em 2007, em um espaço pequeno e com um público muito menor do atual. Maria Vicentina, 76, trabalhou como assistente administrativa no local de 2007 a 2018, lembrou com saudade do período que esteve lá. “Tenho um carinho muito grande pelo espaço, por todas as pessoas que conheci e momentos inesquecíveis que vivi”.
A contagense contou que com o tempo o local passou por muitas mudanças, como a ampliação de espaços e de atividades ofertadas. "O que era cerca, hoje é muro. Os idosos que participam hoje também têm mais opções, como ioga e artesanato. Participei e presenciei muitos eventos, como os de Carnaval, os concursos do Festival das Abóboras, a Olimpíada dos idosos e várias outras festividades".
A região de Vargem das Flores, com sua rica história, vasta área verde e crescente infraestrutura, tornou-se um pilar fundamental para o desenvolvimento de Contagem. Mais que hospedar um manancial e áreas de natureza preservadas, a região se consolidou como um polo de vida comunitária para seus mais de 70 mil habitantes. A trajetória da região, marcada pela união de seus moradores na construção de um futuro melhor, reflete o dinamismo e a capacidade de adaptação da própria cidade, provando que o equilíbrio entre a preservação ambiental e o desenvolvimento urbano é não apenas possível, mas essencial para um crescimento sustentável e próspero.
